A PEC dos Precatórios: A Proposta de Emenda à Constituição nº 23

15/02/2022

Desde novembro de 2021, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal e todo o sistema legislativo têm se deparado com discussões a respeito dos precatórios, que nada mais são do que requisições de pagamento expedidas pelo Poder Judiciário para cobrar de determinado ente federativo, autarquias ou fundações, o pagamento de valores devidos em decorrência de condenação judicial definitiva.

O debate nas casas legislativas começou com a apresentação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 23/2021 – apelidada de “PEC do Precatórios” – que pretendia alterar o procedimento de pagamento dos precatórios, já que o valor total do pagamento de precatórios para 2022 iria praticamente dobrar e, consequentemente, ocupar um espaço muito maior do que o esperado. Como a regra do teto de gastos determina que o total de despesas do governo em um ano deve se manter o mesmo do ano anterior – apenas corrigido pela inflação – o total de orçamento livre para gastar com qualquer outra coisa seria praticamente nulo.

A primeira alteração prevista na proposta refere-se §2º do artigo 100 da Constituição Federal e trata dos precatórios alimentares relativos aos titulares com 60 (sessenta) anos ou mais de idade e pessoas com deficiência ou portadores de doença grave, que recebem tratamento prioritário. Nestes casos, os créditos devem ser pagos com preferência em relação aos demais até o limite correspondente ao triplo do previsto para o pagamento à vista, ou seja, até o máximo de três vezes o valor de R$ 66 mil, com a possibilidade de fracionamento do valor e posterior pagamento do restante de acordo com a ordem cronológica de apresentação da requisição.

A PEC também prevê a possibilidade de parcelamento dos chamados “superprecatórios”, ou seja, os precatórios cujo valor seja superior a “1.000 (mil) vezes o montante definido como de pequeno valor– no caso da União, o valor equivalente, atualmente, a R$ 66 milhões”[1]. Por outro lado, as requisições de pagamento de até R$ 66 mil devem ser integralmente pagas, sem possibilidade de parcelamento, enquanto os precatórios cujo valor se insira entre R$ 66 mil e R$ 66 milhões dependem da capacidade de orçamento da União em cada ano, de modo que aqueles que não forem quitados ficam organizados em ordem decrescente de valor, sob o parâmetro de 2,6% da receita corrente líquida acumulada nos doze meses anteriores à requisição.

No caso dos precatórios para o pagamento de dívidas da União relativas atual Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) devem ser pagos em três anos, sendo 40% no primeiro ano, 30% no segundo e 30% no terceiro ano.

Com relação ao teto dos precatórios, atualmente, o cálculo do valor considera a inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apurado entre julho de determinado ano até junho do ano seguinte. Todavia, conforme a redação aprovada, a nova metodologia determina que o cálculo terá como base a aplicação do IPCA acumulado do ano anterior descontadas as requisições de pequeno valor.

Ficam excluídos do limite anual dessa despesa no orçamento e também do teto de gastos, os precatórios pagos com desconto e os precatórios de credores privados que optarem por utilizar o crédito (i) para pagar débitos com o Fisco; (ii) para comprar imóveis públicos à venda; (iii) para pagar outorga de serviços públicos; (iv) para comprar ações colocadas à venda de empresas públicas; ou (v) para comprar direitos do ente federado na forma de cessão (dívidas a receber de outros credores, por exemplo), incluindo-se, no caso da União, a antecipação de valores devidos pelo excedente em óleo nos contratos de partilha para a exploração de petróleo.

Os precatórios continuam a ser lançados por ordem de apresentação pela Justiça, com observação das prioridades estabelecidas, e aqueles que ficarem de fora em razão do limite terão prioridade nos anos seguintes. Ademais, o credor de precatório não contemplado no orçamento poderá optar pelo recebimento em parcela única até o fim do ano seguinte se aceitar desconto de 40% por meio de acordo em juízos de conciliação.

Outra mudança na regra geral de pagamento de precatórios é o uso da Taxa Selic para atualizar os valores de qualquer tipo de precatório a título de atualização monetária, remuneração do capital e compensação de mora.

O texto inicial incluiu, além das referidas propostas de parcelamento já aprovadas, uma alteração na chamada “regra de ouro” prevista no artigo 167 da Constituição Federal. Tal regra tem como objetivo conter os desequilíbrios fiscais na elaboração do orçamento e, para isso, estabelece que para cobrir gastos correntes, é necessária uma autorização por parte do Congresso para a concessão de um crédito suplementar ou especial no orçamento, que requer maioria absoluta para a aprovação. Ainda que, os pedidos de autorização do Congresso para financiar gastos correntes com dívida pública seja comum, a referida proposta foi rejeitada e não incluída no texto final.

Inicialmente, se a redação aprovada pela Câmara dos Deputados fosse acolhida integralmente, a proposta liberaria um espaço de mais de R$ 90 bilhões no orçamento de 2022 [2] contribuindo, inclusive, para a viabilização do programa social “Auxílio Brasil”, anunciado para suceder o “Bolsa Família”.

Apesar de, em novembro de 2021, a PEC ter sido aprovada pela Câmara sem alteração em sua redação, parte da proposta foi promulgada em dezembro, dando origem à Emenda Constitucional nº 113 e, outra parte, foi promulgada posteriormente no mesmo mês, dando origem à Emenda Constitucional nº 114.

Ambas as emendas serão abordadas em artigos que serão publicados pela equipe do Orizzo Marques Advogados e darão continuidade à temática de pagamento de precatórios, trazendo explicações acerca das alterações incluídas por cada uma delas e as respectivas implicações.

Eugenia Loureiro

[1]https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node0n2wcrnwgkqwa13cedjiu0gdsb934491.node0?codteor=2054008&filename=PEC+23/2021

[2]https://www.istoedinheiro.com.br/pec-dos-precatorios-espaco-fiscal-de-r-916-bilhoes-e-o-necessario-diz-bezerra/

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