Escritórios abrem mercado para bacharéis sem inscrição na OAB
14/12/2021
Passar no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) nem sempre é uma tarefa fácil. Alguns dizem que a prova cria um “limbo social” e a dificuldade piorou no ano passado, devido à pandemia. Mas, ao mesmo tempo, fez crescer um novo mercado: o dos paralegais. Em geral, são bacharéis em direito que trabalham em funções relacionadas ao exercício da advocacia, mas que não exigem o registro na OAB.
Dos 136.878 bacharéis que fizeram a prova em 2020, apenas 23.165 passaram – 18,74% do total. Neste ano, no primeiro exame, dos 235.910 inscritos, apenas 44.653 – ou 21,3% do total – foram aprovados. Uma segunda seleção está em andamento.
“A pandemia causou impacto também na realização do exame da Ordem. Com isso, está mais comum a contratação do paralegal do que era no passado”, afirma o advogado Alessandro Orizzo, sócio do escritório Orizzo Marques Advogados. A banca tem hoje quatro analistas jurídicos, que concluíram a faculdade e ainda não conseguiram a carteira da OAB – documento que permite que o profissional possa exercer legalmente as atividades de advogado.
Orizzo destaca que o bacharel em direito tem familiaridade com as questões legais, o que facilita a realização de serviços em cartório e obtenção de registro e certidões em junta comercial ou na Receita Federal. “Antes usávamos despachante, mas resolvemos internalizar esse serviço”, afirma o advogado.
Paralegal no Veirano Advogados, o bacharel em direito Guilherme Nicodemos, que se formou em 2018, pelo Centro Universitário FMU, considera que a atividade exercida é uma oportunidade para iniciar a carreira. “Até mesmo as demandas administrativas acabam trazendo conhecimento, além da supervisão dos advogados que sempre acrescentam experiências”, diz. “E, como somos formados, sempre atribuímos valor técnico aos trabalhos, ainda que burocráticos”, acrescenta.
O Veirano possui, atualmente, 11 paralegais, pessoas com formação que não podem mais ocupar uma vaga de estagiário, segundo Corina de Magalhães Engel, diretora executiva do escritório. “O ex-estagiário, logo após formado, acaba perdendo a posição antes ocupada, mas não pode advogar sem o registro na OAB. Desta forma, o que antes era uma lacuna profissional tornou-se uma oportunidade de desenvolvimento e de maior formação na área do direito”, afirma.
A Ordem dos Advogados do Brasil acompanha de perto a atuação dos paralegais, para verificar se não exercem, sem registro, a função de advogado. Marcela Arruda, advogada do escritório Rubens Naves Santos Júnior, reforça que esses profissionais devem cumprir apenas a tarefa de assistência. “A OAB fiscaliza se esse tipo de profissional não está se apresentando como advogado. Se isso ocorrer é considerado exercício ilegal da profissão”, diz.
Uma demanda específica em relação a prazo processual fez o escritório Maneira Advogados criar uma área de assessoria jurídica formada por bacharéis em direito sem a OAB. “O prazo processual é o coração da advocacia”, afirma a advogada Rosara de Oliveira Maneira, sócia do Maneira Advogados.
Os bacharéis entendem de processo e prazos, entre outras questões, e reportam o andamento processual para os sócios do Maneira Advogados. O escritório conta atualmente com nove paralegais. “Eles atuam nas áreas tributária, cível e, agora, estamos criando a assessoria jurídica societária”, diz Rosara.
O escritório Andersen Ballão Advocacia optou, há três anos, por ter um setor paralegal e oferecer o serviço a outras bancas. “Antes tínhamos um paralegal para cada departamento, mas optamos por centralizar e nosso departamento paralegal gera receita de parcerias com escritórios do país inteiro”, afirma o advogado da banca Maicon Borba.
O Andersen Ballão Advocacia tem hoje 115 colaboradores e conta com cinco profissionais no departamento paralegal. Borba conta que esses profissionais tratam de temas ligados a órgãos públicos – juntas comerciais, entre outros -, que requerem conhecimento jurídico.
“Quando uma empresa pede para fazer uma alteração contratual, por exemplo, a equipe paralegal avalia quais implicações essa mudança terá, que podem ir além da questão societária”, diz Borba. “O paralegal mostra o que existe de mais atualizado na junta comercial e suas exigências, por exemplo.”
Procurado pelo Valor, o Conselho Federal da OAB informou, por meio da sua assessoria de imprensa, que defende o cumprimento da legislação – o exercício da advocacia pelos profissionais formados para essas atividades.
Em 2013, quando surgiu o Projeto de Lei n° 5.749, para criar a profissão do paralegal, de autoria do deputado Sergio Zveiter (PSD-RJ), a OAB e outras entidades que representam a advocacia se posicionaram contra a proposta. A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara chegou a aprovar o texto em caráter conclusivo permitindo o trabalho na área, desde que sob a responsabilidade de um advogado e por até três anos. A proposta, porém, está parada desde então.
Publicado por Valor